3 de junho de 2012

Cineclube Edith Cultura - 1º sessão na ASES


O Cineclube Edith Cultura retomou as atividades na última quarta-feira, 30 de maio. A sessão aconteceu na sede da ASES e o público compareceu em peso para prestigiar a nova parceria.

Além da exibição de "Tudo sobre minha mãe", de Pedro Almodóvar,  houve, ainda, um bate papo com o professor, filósofo e artista plástico Mathias e Abreu Lima Filho, que falou um pouco sobre o filme e diretor. 

Foto de Quique Brown

Para quem participou da sessão e também para quem viu o filme em outra ocasião, Mathias preparou o pequeno texto a seguir, a fim de ajudar a compreender melhor a obra de Almodóvar.


TUDO SOBRE MINHA MÃE 


1999 – Direção: Pedro Almodóvar Trilha sonora: Alberto Iglesias
Personagens: Esteban (Eloy Azarí) Manuela (Cecilia Roth) Huma Rojo (Marisa Paredes)
Agrado (Antonia San Juan) Irmã Rosa (Penélope Cruz) Nina (Candela Peña) Lola (Toni Cantó)
Prêmios: Oscar - filme estrangeiro – 2.000 Globo de Ouro - filme estrangeiro – 2.000
Cannes – Palma de Ouro – melhor diretor Cesar – França – melhor filme estrangeiro
Goya – Espanha - 7 categorias (melhor filme e melhor direção)

“Este é o meu filme mais comovente e feminino. Os estrategistas militares são homens, os grandes estrategistas da vida cotidiana são as mulheres.” (Folha 09/10/1999)

Cena de "Tudo sobre minha mãe"

TUDO SOBRE MINHA MÃE é uma obra rica e complexa, de interpretação inesgotável. O autor transforma histórias particulares bizarras, com personagens incomuns, numa sensível obra de arte. Trabalha o drama intimo de personagens que nos surgem aparentemente caóticos, mas nada é gratuito e tudo é colocado em seu mais perfeito lugar. Há beleza por toda parte. São dramas individuais paralelos, em que ele costura as pontas que os prendem ao fio da história, por vezes quase absurda, mas nunca artificial.

Possui a qualidade de harmonizar os dramas, tornando o incomum natural, o obscuro claro, sempre através de uma poesia visual humanizada. Não vemos heróis ou vilões, mas pessoas reais que erram e acertam em suas vidas. Caricaturas às vezes hostis que se transformam em pura integridade. Em oposição à tolerância, Almodóvar propõe a naturalidade. A tolerância mantém ainda um elemento moral de aceitação (com algum preconceito embutido), mas a naturalidade é toda a positividade do ser humano. Talvez a sua maior qualidade como artista seja a de ser, no fundo, um grande humanizador de personagens.
Foto de Quique Brown

Alguns críticos classificam sua obra como Pós-moderna mas, embora utilize a metalinguística como neste filme, preocupa-se na verdade principalmente com a função emotiva. Há trechos de “Tudo sobre minha mãe” que remetem ao filme “A Malvada” (All about Eve – 1950) de J. Mankiewcz, com Bette Davis e Anne Baxter, que ganhou 6 das suas 14 indicações ao Oscar. Vem daí o título do filme/livro comentado por Esteban com sua mãe.

Faz referência também ao livro “Música para Camaleões” (Music for Chamelions – 1980) de Truman Capote, o presente de aniversário da mãe para Esteban. E principalmente, utiliza trechos e faz um diálogo com a peça de Tennessee Willians de 1950, “Um Bonde chamado Desejo” (A Streetcar Named Desire), onde a personagem Huma Rojo representa outra personagem, Blanche Dubois. Uma é “blanche” e a outra é “rojo”.

Foto de Quique Brown

No final do filme, Almodovar oferece-o: - ““A todas as atrizes que interpretam atrizes, às mulheres que interpretam, aos homens que interpretam e se convertem em mulheres, a todas as pessoas que querem ser mães. À minha mãe.”

Os comportamentos dos personagens parecem ser vistos pela lógica de uma mãe – uma lógica que permite tudo, de aceitação irrestrita. Podemos afirmar que esta é também a lógica de seu olhar. Uma lógica diferente da masculina, absolutamente não-cartesiana, que equaciona com flexibilidade e carinho as questões de vida dos personagens.

Certamente alguns de seus temas são ainda delicados como: identidade sexual, AIDS, travestismo, religião, liberdade existencial, palavrões crus, etc.. e podem não agradar aos mais conservadores. Critica o puritanismo e a hipocrisia da sociedade, por vezes, com obscenidades agressivas, tratando-as com uma naturalidade quase ingênua.

As suas imagens poéticas com cenários e figuras coloridas, bem como suas canções e arranjos magistrais, por vezes velam perversões que podem conduzir à morte ou à destrutividade, mas que podem também levar ao auto-conhecimento e à emancipação.

Almodóvar nos indica assim através de sua obra, com um conselho quase maternal, que em vez da paralisia insana e destrutiva, um desdobramento autêntico e saudável para a realização do próprio destino, pode ser uma via para a própria salvação.


Mathias de Abreu Lima Filho

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe-nos um comentario,aceitamos sugestões!